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domingo, 26 de maio de 2013

Adeus


"Mas que vida desgraçada!" pensou ela, rasgando mil cartas e, com essas, mil promessas e sonhos.

Sim, mais mil desejos desfeitos. Depois de tanto tempo quem imaginaria que as coisas iam findar desta maneira? Tolice. O que é o "pra sempre" nesta vida? Nem a própria vida o é. Só restava à moça esquecer tudo o que vivera com ele, aceitar o término e seguir em frente. Talvez um dia se encontrassem. Talvez não. Que importa? O que lhe restava naquela hora era a certeza de que teria que apagá-lo de sua mente. Ou, pelo menos, escondê-lo num baú imaginário, trancado a sete chaves, oito, dez, quantas fossem preciso. Fogo. Fumaça. Lágrimas. Cartas, bilhetinhos casuais, fotos e, olhe só, aquele urso de pelúcia com o perfume dele: tudo virando cinzas. Há quem diga que isto é bobagem, infantilidade. Mas veja só, queimando as lembranças. De que adianta? Mas, naquele momento, ela se sentia vulnerável, fraca, temerosa. O que lhe restava era uma caixa com fósforos e outra com recordações. Que fazer? Nada mais óbvio. E justo. Ver todos aqueles anos se transformando em cinzas. Questão de segundos. Mas era reconfortante, de certa forma, apesar de doloroso. Representava a passagem, uma espécie de metamorfose. Do tudo para o nada. Do amor para o esquecimento, a indiferença. Chorou o que tinha que chorar, se fosse preciso agarrava os travesseiros e abafava os gritos. Desespero? Talvez. Quem julga? Todos. Mas não há quem não sofra por amor. Ou pela falta dele. Amigas? Não, não queria cansá-las com a mesma ladainha de sempre. Preferiu se calar. Pôr pra fora a sós, durante o banho, quando o barulho do chuveiro se confundia com o de suas lágrimas. Um mês, dois, doze, quem sabe. Pouco importava o quanto isso ia durar. O que se sabia era apenas uma coisa: Vai passar. Aos poucos o rosto dele ia se transformando num borrão em sua mente. Das promessas e planos tratou de se desfazer em poucos dias. Um luto aqui, outro acolá. Que gosto teria a vida se não fosse isso? Paciência. Então, num dia, com um sol bonito, cara de alegria, surge-lhe uma figura tão familiar. Quem seria? Conheço este sorriso. Mas de onde? Ah, nossa! Há quanto tempo, não é mesmo? Como vai a vida? E a família? Mande um abraço para sua mãe, outro para sua irmã. Até logo, estou atrasada. Suspirou. Quanto tempo faz? Já nem lembra. Mas que engraçado. Piada boba esta. Nem percebeu que já o havia esquecido. E ele lá com aquela cara de bobo. Tanto tempo depois e ela ficara mais linda do que ele podia supor. Fui burro? Que droga, pensou. Tarde demais. Nunca a vi com um sorriso tão sincero. E aquela pressa? Falou como se eu fosse qualquer pessoa passeando no parque. Continuou seu caminho, chutando umas pedras na calçada. Reencontro fatal. Destino cruel. Pensou: "Mas que vida desgraçada!"


Sâmia Monteiro

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